O estAdio que veio de trem
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O som do apito é ouvido na Vila Capanema. Familiar aos moradores, ecoa pelo ar. Não se trata, porém, do apito de um juiz arbitrando um jogo de futebol e, sim, do aviso da chegada do trem que traz as primeiras doações para a construção do estádio do Clube Atlético Ferroviário do Paraná. O ano é 1943, e sob supervisão de Durival Britto e Silva, responsável pela RPVSC (Rede Viação Paraná-Santa Catarina), a composição descarrega as primeiras madeiras para o início das obras. Na época, Curitiba já contava com alguns pequenos estádios de futebol, como o Major Paula Soares, conhecido como “Fazendinha” e pertencente ao Britânia, o Franklin Delano Roosevelt, da Sociedade de Educação Física Juventus, e dois pertencentes aos principais times adversários do Ferroviário: o atual Atlético Paranaense, que tinha posse do estádio Baixada da Água Verde, cuja construção foi iniciada em 1914, e o Coritiba, que possuía o Belfort Duarte, inaugurado em 15 de novembro de 1932, e que atualmente chama-se Major Couto Pereira. Incomodado com a situação de seu clube ser grande, mas não possuir um estádio proporcional ao seu tamanho, Reinaldo Thá, prestador de serviços da RPVSC e homem muito ligado ao time do Ferroviário, resolveu tomar uma atitude em prol do esporte que tanto amava. A relação dele com o time começou quando ele defendeu e presidiu o Britânia, clube que deu origem ao Ferroviário em 1930. Reinaldo era uns dos seis filhos de Maurício Thá, grande construtor civil originário da Itália, de onde fugiu da perseguição política. Ele chegou ao Brasil em decorrência da construção da estrada de ferro que ligaria Curitiba a Paranaguá. A família Thá sempre esteve ligada ao futebol do Paraná. Dos seis filhos de Maurício, todos os cinco homens praticaram o esporte bretão. Seu sobrinho, Carlos, também foi jogador e um dos fundadores do Britânia. Seguindo os passos do pai Maurício, Reinaldo e Orestes tocavam a empresa de construção “Irmãos Thá”, responsável por diversas obras na década de 1940 e prestadora de serviços para a rede ferroviária. Com grande influência no clube e contato direto com o presidente (3), Reinaldo sugeriu a construção de um estádio para o Ferroviário treinar e jogar. Tiveram início, então, as conversas sobre o que viria a ser o “Colosso da Vila Capanema”. Até então, o time não dispunha de um local ideal para treinos – que ocorriam numa área descampada, ao lado do terreno de manobras dos trens. O terreno ficava no que era considerada a zona II da cidade, região industrial de Curitiba, onde estavam instaladas as indústrias, moinhos e, consequentemente, a estação ferroviária para a distribuição dos produtos ali produzidos. Lá também ficavam as casas dos operários mais qualificados. A zona I era a Central, onde se localizavam os comércios e moradias de alto padrão. Na década de 1920, a rua 15 de Novembro foi a primeira via a ganhar pavimentação asfáltica na cidade. Por último, a zona III abrigava a moradia dos operários menos qualificados e os sitiantes, trabalhadores rurais da cidade. Essa divisão de zonas com traços urbanísticos hierárquicos, típicos do início do século 20 e influenciados por europeus, perdurou na cidade até o fim da década de 1930. Esse panorama foi alterado com o plano diretor instaurado pela prefeitura no início da década de 1940 para que o município crescesse de forma organizada. Para elaborar um plano urbanístico para a cidade, a prefeitura contratou a empresa paulista Coimbra Bueno e Silva que, por sua vez, solicitou o serviço do arquiteto francês Alfred Agache. Dessa forma, o projeto ficou conhecido como “Plano Agache”. De acordo com Marcelo Saldanha Sutil, coordenador de Pesquisas Históricas da Fundação Cultural de Curitiba, o plano “previa uma expansão da cidade, que não tinha se expandido muito ainda. Era um planejamento consciente, partindo do centro para vias perimetrais”. Entregue à prefeitura em 23 de outubro de 1943, o projeto foi essencial para o crescimento planejado da cidade. Foi criado o “Plano das Avenidas”, responsável pelo alargamento de ruas e avenidas como Visconde de Guarapuava, Sete de Setembro e Marechal Floriano Peixoto. Houve a interligação dos centros com as áreas externas da cidade, privilegiando praças, jardins e parques públicos. A partir dessa época, a cidade implantou um centro militar (Bacacheri), um esportivo (Tarumã), um de abastecimento (Mercado Municipal), um de educação (Centro Politécnico), um industrial atrás da estação ferroviária (Rebouças), um administrativo (Centro Cívico) e alguns centros de recreação e lazer (Parque Barigüi), sendo então setorizadas as regiões da cidade. Nessa época, a terceira geração da família Thá, os filhos de Reinaldo, Hélio e Reinaldo Jr., jogavam no time infantil do Ferroviário. Isso os ligou ainda mais ao clube e alimentou as esperanças do pai em ter um estádio para o time que os filhos defendiam. Incansável na busca de um sonho, Reinaldo Thá solicitou a Rubens Maister, projetista de sua empresa, que fizesse o projeto do estádio. Com o projeto em mãos, Reinaldo procurou o superintendente da Rede Viação Paraná-Santa Catarina e patrono do Clube Atlético Ferroviário, o general Durival Britto e Silva, e o consultou sobre a possibilidade de uma contribuição financeira para a construção do estádio. O general Britto e Silva, homem muito simpático e apreciador do futebol, chegou a Curitiba por meio do Estado Novo, quando a rede ferroviária foi nacionalizada. “Na estrada de ferro, naquela época, havia muita corrupção, muito roubo, e Getúlio Vargas mandou o general Durival Britto, do Rio de Janeiro, para ser diretor da rede”, lembra José Maria Barbosa, “Barbosinha”, historiador do Paraná Clube. Primeiramente, foi enviado para comandar a rede o coronel Manoel Tibúrcio Cavalcanti, que ficou apenas um ano no cargo e faleceu vítima de um colapso cardíaco. Então, para sucedê-lo, chegou do Rio de Janeiro Durival Britto e Silva. O general era considerado um “pai” para os operários da rede, pois construía escolas profissionalizantes e respeitava os direitos e deveres do Estatuto dos Funcionários Públicos. Ele também melhorou os serviços médicos, hospitalares, alimentares e habitacionais, com o objetivo de elevar o nível intelectual e profissional dos ferroviários. Britto e Silva se entusiasmou com o projeto da Irmãos Thá para a construção do estádio do Ferroviário, pois a empresa possuía um bom histórico e havia deixado marcas em suas construções espalhadas pela cidade. Durival, no entanto, disse que a rede não dispunha de recursos financeiros para a obra, mas afirmou que poderia auxiliar no transporte dos materiais, doando um vagão de trem para o serviço. Como o transporte via ferrovia era o mais utilizado e também o mais caro naquela época, Reinaldo Thá não pestanejou em aceitar a contribuição, que representava o início da realização de seu sonho. Conta-se que Reinaldo já tentava há tempos convencer o general Durival a autorizar a construção do estádio, mas que o oficial só se rendeu à ideia após um incidente envolvendo ele e sua mulher em um jogo entre Ferroviário e Juventus no estádio Franklin Delano Roosevelt. “A mulher dele era carioca. Bonita, de vestidão, ela subiu as arquibancadas de madeira, e a gurizada foi embaixo da arquibancada para olhar as pernas da mulher e começou a provocar”, contou o jornalista Carneiro Neto. Foi neste momento que Durival viu a necessidade de se construir um estádio moderno. Logo no dia seguinte, ele se reuniu com os diretores do clube e autorizou o início do projeto. Este sonho já era almejado por homens ligados ao clube, dentre eles Carlos Dondeo, Atílio Ramom e Lineu Ferreira do Amaral, que até o momento não tinha ideia de que seria um dos responsáveis pelo “Colosso da Capanema”. O time do Ferroviário, como o próprio nome diz, era basicamente formado pelos funcionários da rede ferroviária. A maioria dos jogadores trabalhava durante o dia na construção da ferrovia Paraná-Santa Catarina e depois se divertia batendo bola. Entre os poucos jogadores profissionais, destacava-se João Maria Barbosa, que atualmente é o historiador do Paraná Clube. Ele entrou para o time em 1944 e, quando chegou ao campo para treinar, viu a precariedade das instalações do Ferroviário. “Não tinha nada. Tinha o campo, mas era campo de treinamento aberto, campo de várzea mesmo”, afirmou o ex-atleta. O Ferroviário era bancado pelos próprios funcionários da rede espalhados por todo o Paraná. Muitos, porém, não sabiam que eram contribuintes do clube, já que uma pequena quantia do salário era descontada automaticamente da folha de pagamento todo mês. Mas o montante arrecadado não era suficiente para cobrir os custos da obra de um grande estádio de futebol. Reinaldo, portanto, empenhou-se em conseguir o material para a construção. Restava, assim, escolher o terreno para erguer o complexo esportivo. E o local que se mostrou mais propício para as obras foi o campo ao lado do pátio de manobras dos trens, que servia como gramado para treinos do clube. “O local só tinha trave, era o campo de treinamento, porque o ferroviário jogava no campo do Coritiba e do Atlético”, lembra Barbosinha. Uma parte do terreno pertencia ao governo do estado, e outra parte, ao município de Curitiba. Os dirigentes do Ferroviário, então, tiveram que solicitar a doação dos lotes ao poder público. Uma parte de toda a carga de material que passava pela estação de Curitiba era destinada às obras do estádio, graças aos pedidos de Reinaldo. Quando determinada empresa precisava usar linhas férreas para o transporte de seus produtos, ele pedia parte da carga como doação para o estádio. As empresas não hesitavam em ceder o material, uma vez que viam, no gesto, uma oportunidade para conquistarem mais vagões e facilidades nos transportes. O superintendente da rede, Durival Britto e Silva, e Reinaldo Thá ofereciam regalias, como mais vagões (13) às empresas que faziam doações. Uma das doações mais notáveis encontra-se no estádio até hoje e serve de referência para o clube. Trata-se de um relógio de corda datado de 1884, com grandes ponteiros, oferecido pela antiga estação de trem da rua Barão do Rio Branco. Ele foi instalado bem no meio do estádio, no alto das arquibancadas e entre duas torres. O responsável por dar corda e manter o relógio funcionando é José dos Santos, o “Seo Zé”, que trabalha no clube desde 11 de setembro de 1958. Dessa maneira, com doações, ajuda de fornecedores e funcionários da rede ferroviária, os engenheiros Lineu Ferreira do Amaral, Walter Scott de Castro Vellos e Aécio Portes, tendo como mestre de obras Felício Bassani, colocaram em prática o projeto de Rubens Maister. Aos poucos, foi surgindo, no extremo da cidade, o estádio que seria o orgulho do Clube Atlético Ferroviário. Foram quatro anos de espera desde o início das obras, em 1943, até seu término, em 1947. Nesse período, a prefeitura construiu a ponte sobre o rio Belém, facilitando a chegada ao estádio, que até então era realizada apenas pelo pátio de manobras dos trens. “Os caras vinham pescar aqui, tem um rio do lado de lá e outro do lado de cá, pegavam traíra”, comenta o “Seo Zé” nos fundos do estádio. A vontade de ter um local próprio aumentou no ano de 1944, quando o Clube Atlético Ferroviário foi campeão estadual com uma campanha incrível. Havia terminado o primeiro turno desacreditado e, de forma excepcional, conseguiu se tornar o grande campeão daquele ano. Os jornais da época deram grande mérito ao time. O “Jornal da Tarde” de 6 de setembro de 1944 destacou, em manchete, que o Ferroviário, “depois de um desastroso início, onde chegou a ocupar a ‘rabeira’ do certame, uma brilhante e notável reação que sensacionalisou a cidade, a sua campanha no campeonato foi brilhante como atestam os números”. A publicação se referia às sete vitórias consecutivas do time, com 24 gols marcados e oito sofridos. “Uma meritória campanha cujo epílogo somente poderia finalizar com a obtenção do cetro máximo do futebol citadino”, publicou, por sua vez, o “Diário da Tarde” de 1˚ de dezembro daquele ano. O jornal também ressaltava o papel dos dirigentes no desempenho do Ferroviário no campeonato. Em 6 de setembro, o “Diário da Tarde” publicou que o clube foi campeão “graças ao esforço conjunto de todos os seus elementos, concepção de verdadeiro esporte de seus dirigentes”. Lineu Ferreira do Amaral e Walter Scott Velloso chegaram a ser elogiados por seus trabalhos no clube. O mesmo jornal chegou a comentar que “entraram ambos, em perfeita harmonia de vistas, desde que assumiram, respectivamente, o cargo de presidente e tesoureiro geral”. Naquele momento, a atenção já se voltava ao que surgia ao lado da estação ferroviária. As obras do estádio se tornaram um ponto de visitação de curiosos, que não se cansavam de elogiar o que viam. “Maravilhoso, colossal, admirável”, retratou o “Diário da Tarde” de 1º de dezembro de 1944. O que se via no local era algo totalmente novo, nunca visto por aquele povo, talvez nunca imaginado. Nos primeiros dias de 1947, os jornais já noticiavam a expectativa da cidade em torno da inauguração do estádio. Foi divulgada a visita de personalidades locais ao complexo esportivo, entre eles políticos, autoridades e diretores do clube, que percorreram as instalações do local. Em 14 de janeiro, o jornal “Gazeta do Povo” estampou nas páginas do caderno de esportes as fotos do general Britto diante das arquibancadas do estádio e de Lineu Ferreira do Amaral. “Acontecimento de relevante significação para o Paraná. A próxima inauguração da maior praça de esportes do nosso Estado, o estádio ‘Durival Brito’ mui justamente apontado como um dos maiores e mais perfeitos de todo o Brasil. Dois nomes que a história vai guardar: General Durival Brito e Silva e Dr. Lineu Ferreira do Amaral”, destacou o jornal a Gazeta do Povo. O diário ainda disse que o general Durival Brito e Silva era “o dedicado realizador da obra do Capanema, orgulho dos desportos paranaenses”, “enriquecendo o patrimônio material do nosso Estado com essa magnífica praça de desportos”. A inauguração do estádio, em 23 de janeiro de 1947, ocorreu sob grande expectativa. Quando os ponteiros do relógio instalado no centro das arquibancadas marcavam 21 horas, Britto e Silva discursou sob os olhares atentos de 18 mil pessoas, dando início à solenidade. Após falar sobre as instalações do estádio, que continha pista de corridas, quadras de tênis, basquete e vôlei, piscina, cancha para jogo de boliche, apartamentos para concentração de atletas e auditórios para concertos musicais, Durival descreveu todo o processo de construção do complexo. Ele também agradeceu aos políticos locais e autoridades de outros estados. “Com os sentimentos que inspiraram essa grandiosa obra e rogando a proteção de Deus para os seus patrióticos desígnios, convido S. Excia o senhor Interventor Federal para declarar oficialmente inaugurado o Estádio da Rede de Viação Paraná-Santa Catarina”, concluiu Durival em seu discurso. Os festejos contaram ainda com uma partida entre o então supercampeão do Rio, o Fluminense, contra o Ferroviário. A partida foi encerrada com o placar de 5 a 1 para os visitantes. O público do jogo, portanto, viu nascer o terceiro maior estádio do país, perdendo apenas para o São Januário, no Rio de Janeiro, e o Pacaembu, em São Paulo. A casa do Ferroviário ocupava uma área total de 48,4 mil m2, possuía duas grandes arquibancadas de concreto armado e alvenaria de pedra e tijolo, e contava com modernidades para a época, como túnel de acesso dos vestiários para o gramado, tribunas reservadas para autoridades, cabine-observatório para o serviço de imprensa, sala para juízes, gabinetes médicos e odontológicos, vestiários, banheiros, restaurante e bares. O destaque do complexo esportivo, porém, era uma concha acústica, nos mesmos moldes da existente no Estádio do Pacaembu. A ideia da concha foi do engenheiro Samuel Chameki, que trabalhava na construtora Irmãos Thá. Na inauguração da praça de esportes, o clube arrecadou 132 mil cruzeiros. No decorrer dos anos, milhares de pessoas assistiram aos jogos no estádio do Ferroviário, mas o que não se imaginava, na época, é que o surgimento daquela praça de esportes reservava algo mais magnífico para a cidade. |
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Uma Copa, uma oportunidade
Com a especulação de que a Copa do Mundo seria realizada no Brasil, diversas cidades do país lutaram para abrigar os jogos do torneio. Não pela grandiosidade do evento, porque seria apenas a quarta edição do Mundial e, naquele tempo, uma Copa não tinha a magnitude de hoje, mas sim pela visibilidade que o município teria dentro e fora do país.
Com 180 mil habitantes em 1950, de acordo com o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), Curitiba não estava entre as cidades mais conhecidas do país. Portanto, receber jogos do Mundial era uma oportunidade para crescer e aparecer para o mundo. Como a cidade possuía o terceiro maior estádio do país, não seria difícil convencer a CBD a escolher Curitiba como uma das cidades-sede. Demonstrando interesse em trazer o evento ao estado do Paraná, o governador Moysés Lupion convidou o então presidente da confederação, Rivadávia Corrêa Meyer, para conhecer o estádio. Em 22 de novembro de 1949, Rivadávia, junto com uma comissão formada, entre outros, pelo superintendente Irineu Chaves e Castelo Branco, visitou as instalações do Durival Britto para uma vistoria geral. Eles ficaram impressionados com o que viram. A única exigência para que a cidade pudesse sediar a Copa seria aumentar a capacidade do estádio de 18 mil para 30 mil pessoas. Curitiba, então, conseguiu o apoio da Fifa e da CBD para receber jogos do Mundial. Foi fechado um acordo com a entidade máxima do futebol brasileiro, pelo qual o Paraná se comprometeu a dar 300 mil cruzeiros à CBD para sediar o torneio. O governo também financiou parte das obras de ampliação do estádio. Devido à desistência de algumas seleções de participar do torneio, o Mundial contou com menos jogos do que o programado, o que fez com que apenas duas partidas fossem disputadas na capital paranaense. Mais de 100 repórteres e fotógrafos estrangeiros se dirigiram à Curitiba para cobrir os jogos. A ideia de expor a cidade para o mundo estava dando certo. O problema era o clima entre os curitibanos. Uma semana antes do início dos jogos, a imprensa, sentindo a frieza da população, fazia apelos para que as partidas do campeonato estadual fossem antecipadas para não coincidir com os embates do Mundial. “Lançamos mesmo o nosso apelo a todos os clubes, para que cooperem decisivamente nesse sentido, transferindo ou antecipando jogos e festivais que acaso já estejam programados para domingo”, pediu o jornal “Gazeta do Povo”, em 20 de junho de 1950, a seis dias da estreia da Copa. A falta de interesse estava ligada ao fato de Curitiba ser uma cidade colonizada por europeus, principalmente italianos e alemães, e os jogos disputados no município serem entre Espanha e Estados Unidos, e Suécia e Paraguai, respectivamente em 25 e 29 de junho. As partidas começavam às 15 horas, o que também dificultou o acesso do público. As delegações se hospedaram nos hotéis Yoncher, Brás Hotel e Grande Hotel Moderno, conforme lembra Carlos da Costa Coelho, que assistiu aos dois jogos na cidade e vivenciou o clima nas ruas em 1950. “Era uma coisa tão diferente, eles iam de táxi para o estádio. Eles também se vestiam [com o uniforme de jogo] no próprio hotel e já iam trocados”, contou Coelho. Mas, na época, os bondes e os ônibus eram os meios de transporte mais utilizados para se locomover pela cidade. Os principais pontos de parada ficavam nas praças de Curitiba. Em 25 de junho, os selecionados espanhol e norte-americano entraram em campo. Logo no início do dia, os jornais, como a “Gazeta do Povo”, publicavam notas sobre o jogo: “Para facilitar o acesso do público, haverá, no dia de hoje, a partir das 10 horas da manhã, serviço especial de transporte para o estádio da Vila Capanema, executado por táxis, lotações e ônibus especiais”. “Nos portões do estádio serão distribuídas milhares de bandeiras do Brasil, Estados Unidos e Espanha”, informou a “Gazeta do Povo”. Apesar de todo o esforço da imprensa e das autoridades para levar o público ao estádio, o jogo contou apenas com 9 mil espectadores, que viram a Espanha golear os Estados Unidos por 3 a 1. A renda registrada foi de 398 mil cruzeiros. Barbosinha, ex-jogador do Ferroviário, acredita que outro fator para as arquibancadas estarem vazias foi o alto preço dos ingressos, que custavam em média 40 cruzeiros. Os bilhetes eram adquiridos na porta do estádio, cerca de uma hora antes do início de casa jogo. “Os ingressos não foram vendidos por antecipação. Não houve recorde de arrecadação e nem de público, porque o ingresso era caro”, explicou. Se o jogo da “Fúria” não teve um grande público, o mesmo pode-se imaginar da segunda partida. No embate entre Suécia e Paraguai, em plena quarta-feira, 7,9 mil pessoas compareceram ao Durival Britto, o que gerou uma renda de 273 mil cruzeiros. Com a baixa presença do público, o governador de Curitiba, Moysés Lupion, forneceu uma verba para a CBD cobrir o prejuízo com os jogos da cidade. Por mais que a Copa do Mundo não tenha sido um sucesso na cidade, as pessoas que estiveram presentes nos jogos guardarão este momento na memória para sempre. Contarão com orgulho que fizeram parte de um Mundial. E talvez torçam para que um dia o “Seo Zé” esqueça de dar corda no relógio, fazendo com que os ponteiros parem e as lembranças de 1950 não desapareçam com o passar do tempo. |